No post anterior, eu descrevi minhas motivações para criar este blog. E uma das mais importantes foi ter sentido a necessidade de incorporar elementos da cultura maker em minhas aulas de Física. E assim, tentar provocar os estudantes a realizarem/desenvolverem seus próprios experimentos científicos.
Ciências e experimentos
As ciências naturais (Física, Astronomia, Geologia, Biologia) estudam as leis que governam o mundo natural através de métodos científicos, cujos pilares são dados quantitativos. Neste aspecto, a Matemática não é um ciência natural pois sua validade não é determinada por experimentos científicos, mas sim uma linguagem descritiva dos fenômenos naturais. Por exemplo, Newton inventou o Cálculo para descrever o movimento dos corpos. Para os interessados em se aprofundar um pouco mais nesta discussão, sugiro este capítulo do famoso livro The Feynman Lectures on Physics.
A importância dos experimentos científicos para obter dados quantitativos é melhor descrita pela célebre frase de Lord Kelvin (aquele da escala de temperatura Kelvin): “medir é saber”. Lord Kelvin acreditava só temos conhecimento daquilo que conseguimos medir e expressar esse conhecimento em números. Se não conseguirmos medir algo, pouco ou nada sabemos sobre ele.
Para construir experimentos científicos é necessário compreender o que são grandezas físicas e suas unidades. Algumas grandezas físicas são tão fundamentais que são descritas em termos de como são medidas: comprimento, tempo, massa e temperatura. Nem é preciso se esforçar muito para explicá-las pois são tão fundamentais que já estão incorporadas ao nosso senso comum. Outras grandezas físicas são determinadas, por exemplo, em função das grandezas fundamentais como é o caso da velocidade (distância percorrida por unidade de tempo), e aceleração (variação de velocidade por unidade de tempo). Há muitas outras grandezas, e uma discussão mais completa sobre grandezas físicas e suas unidades de medida foge um pouco do objetivo deste post.
Nos experimentos científicos, as grandezas físicas são medidas por sensores, e armazenadas para posterior análise de diferentes formas. No passado, as grandezas físicas eram medidas e anotadas em um caderno de laboratório. Em muitos laboratórios de ensino, esse ainda é o método dominante. Pelo lado pedagógico até que faz sentido fazer tudo manualmente. Nos coloca no mesmo lugar que os gigantes da ciência estavam 50, 100 ou 200 anos atrás. Por outro lado, estes avanços científicos evoluíram muito lentamente justamente porque os pesquisadores do passado ainda tinham de projetar os equipamento para realizar a medidas, e só depois podiam se concentrar no fenômeno natural que os deixou curiosos inicialmente.
Hoje temos muitas opções tecnológicas que certamente os pesquisadores do passado teriam usado para acelerar suas descobertas. E podemos fazer isso sem perder a essência do pensamento científico envolvido na construção de experimentos.
Atualmente, a base tecnológica mais simples para desenvolver experimentos para medir grandezas físicas com uma rápida e suave curva de aprendizado é o Arduino.
O que é o Arduino

Arduíno é uma plataforma de microprocessadores muito utilizada em projetos eletrônicos devido a sua versatilidade e simplicidade. O Arduíno é amplamente utilizado tanto em projetos comerciais como em projetos educativos.
Microprocessador é outro nome para um tipo de computador altamente especializado que roda apenas um único programa chamado firmware. Um microprocessador não possui monitor, mouse e nem teclado, mas possui uma pequena memória interna que representa o seu disco rígido, e é onde o firmware fica armazenado. Por outro lado, o Arduino possui muitas entradas lógicas onde podemos acoplar circuitos externos, sensores, pequenas telas de LCD, pequenos botões de comando e outros acessórios. Estes acessórios para Arduíno são conhecidos como shields.
O Arduino também pode se comunicar com outros dispositivos e até mesmo com a internet, dependendo do tipo de shield acoplado a ele. E é justamente esta flexibilidade de comunicação que torna o Arduino uma das plataformas mais utilizadas nas aplicações do tipo Internet da Coisas (ou IoT – Internet of Things). Um outro grande atrativo é o baixo custo. No Mercado Livre, Um placa do tipo Arduino UNO custa aproximadamente R$ 50,00, e um kit para iniciantes (placa mais alguns componentes e sensores) aproximadamente R$ 150,00. Podem ter certeza, vale o investimento!
Para conhecer melhor as potencialidades e aplicações Arduino, clique aqui.
Física com Arduino
A flexibilidade de comunicação e a variedade de shields e sensores disponíveis torna o Arduino uma plataforma muito poderosa para construção de equipamentos de laboratório de ensino e/ou pesquisa científica. Segue abaixo uma lista de tipos de componentes disponíveis e algumas ideias de aplicações:
Componente | Ideias de aplicações |
---|---|
Sensores ópticos | Detectar de passagem de um objeto; medir velocidade; detectar mudanças na iluminação, detecção de cores |
Sensores de temperatura | Medir temperatura ambiente/atmosférica, temperatura da água em diferentes estados físicos, medir temperatura dos objetos, medir condutividade térmica em metais |
Sensor piezoelétrico | Detectar sons, vibrações ou choques mecânicos, emissão de ondas sonoras |
Sensor ultrassônico | Medir de distâncias |
Sensor de gases | Medidas de poluição ambiental (CO, CO2) |
Sensor de flexão | Medidas de força |
Acelerômetro | Aceleração, orientação espacial e mais um monte de dados de dinâmicos do movimento dos corpos |
Com essa variedade de sensores, podemos facilmente construir experimentos simples para demonstrar conceitos físicos como:
- Velocidade média e velocidade instantânea,
- Aceleração média e aceleração instantânea,
- A aceleração da gravidade,
- As leis de Newton,
- Conservação do momento linear,
- Transferência de calor entre corpos com diferente temperaturas,
- A natureza periódica das ondas mecânicas,
- Funcionamento de motores elétricos,
- Conversão da energia solar em energia elétrica,
- E muito, muito mais.
Conclusões
A lista de sensores e componentes disponíveis é grande demais para ser descrita, e todo dia novo sensores são lançados no mercado. As aplicações possíveis são limitadas APENAS por nossa criatividade.
É necessário dizer também que o Arduino não é um microprocessador em particular, mas sim uma plataforma de desenvolvimento. Há uma grande variedade de modelos, de vários tamanhos, com maior capacidade de processamento, mais entradas lógicas, e até mesmo com comunicação wifi já embutida. O tipo e o tamanho de placa depende muito do tipo de aplicação a ser desenvolvida. O custo também varia, mas a simplicidade e flexibilidade de desenvolvimento independe do modelo de placa.
Imagino que este post apenas introdutório possa ser um pouco frustrante já que descreve apenas o que pode ser feito, e não como as coisas são feitas. Vamos seguir adiante com calma. O Arduino tem sim uma curva de aprendizagem rápida, mas também possui alguns passos iniciais que devem ser dados com cuidado, especialmente para os iniciantes.
Nos próximos posts, vamos explorar exemplos práticos de grandezas físicas que podemos medir com Arduino.